Bom dia 🎄🎁🌞
Sim estou aqui no dia 25, dá para acreditar? Eu não tinha planejado um texto para ser a última newsletter do ano, mas uma pergunta interessante chegou no meu formulário e achei que ela seria perfeita para hoje. Digitei a resposta em uma tacada só e acho que isso diz algo sobre algo. Vamos a ela:
“Olá. Sempre fui um perdido, no sentido de não saber o quê fazer da minha vida. Comecei a ler sua news por causa dessa proposta inicial. Seria possível abordar mais temas e até experiências suas sobre!?”
Ri sozinha quando li essa pergunta porque me senti meio atacada por ela. Tipo, “você disse que a sua newsletter ia ser sobre x, me inscrevi e não vi nada disso. Será que agora você poderia cumprir com a proposta, por favor?”, rsrs. E eu entendo que você se sinta lesado como consumidor, talvez o meu projeto tenha mesmo sido uma propaganda enganosa.
Mas acho que mais do que falar sobre estar perdida, o projeto tem sido uma demonstração viva disso. Tinha na minha cabeça que queria registrar este ano fazendo textos estilo diário para compartilhar angústias e decisões focadas na questão trabalho: o que fazer da vida depois que você se demite do emprego dos sonhos, como é começar a ser freelancer e/ou criar um projeto pessoal enquanto você ainda está tentando se recompor de um burnout (que não é o meu caso porque nunca fui diagnosticada com burnout mas acho que estava vivendo algo na órbita dessa palavra sim) e será que um dia millennials como eu conseguirão encontrar uma forma de pagar suas contas e ficar em paz por não serem capazes de aplicar ~propósito e significado em tudo~ como a expectativa que foi colocada sobre nós pedia?
Com exceção da edição #4, entreguei no lugar uma lista de newsletters, sentimentos contrastantes no Primavera Sound, uma espécie de ensaio sobre interdependência, muitas palavras sobre a minha obsessão com o estilo da Alexa Chung, uma crítica a restaurantes minimalistas, momentos angustiados que expuseram meus medos, um pane no meu sistema durante as eleições e minha dificuldade de lidar com redes sociais e envelhecimento.
Apesar de ter ficado constantemente incomodada ao perceber que estava saindo do meu planejamento inicial, consegui fazer as pazes com essa sensação porque, no fim das contas, olhar para esses 21 textos cumpre exatamente o que eu queria, que era ter um reflexo do meu ano — e o reflexo ficou bem mais verdadeiro do que se eu tivesse me forçado a só escrever sobre trabalho ou sobre o processo de tentar encontrar o que quero fazer da vida. No fim, acho que fui coletando pistas do que quero fazer enquanto escrevia sobre outras coisas. Ler tudo isso agora é incrível porque por esses textos posso lembrar de quando fiquei fascinada pelos escritos do Mark Fisher, de quando achei que não conseguiria publicar nada e consegui, de quando estava empolgada para testar formatos, de coisas que pensava com tanta certeza e das ideias que mudei. Esse projeto é a prova de que tenho muito mais dentro de mim do que jamais imaginei e QUE BOM que não segui aquele plano.
Feita essa introdução, quero tentar responder mais diretamente a sua pergunta.
Eu nunca antes me senti perdida na vida. Ao contrário, tracei meu futuro completo ainda na adolescência: ia estudar jornalismo na USP, conseguir um estágio em um grande veículo, entrar na Vogue, passar uma década escrevendo matérias até, aos 35 anos, virar editora e quem sabe chegar a dirigir a revista. Para ficar focada nesse objetivo, moraria sozinha, não sofreria por homens e, por isso, não namoraria ninguém.
Tudo aconteceu como o planejado tirando que não passei na USP, meu tempo como jornalista de moda foi pouco marcado por grandes reportagens, percebi que tenho muita dificuldade de gerenciar pessoas e, portanto, ser editora (quiçá diretora) é algo custoso, sofri algumas vezes por amor e, hoje, moro com meu namorado. Mas, como era de se imaginar, o que saiu do traçado foi sempre a melhor parte: por não ter passado na USP, vivi um ano no Rio de Janeiro estudando na UFRJ e conheci pessoas incríveis que transformaram a forma como eu olhava pro mundo. Nesses doze meses, mudei de ideia em relação à moda e pensei que teria mais a ver comigo fazer jornalismo político ou trabalhar no terceiro setor. De volta a São Paulo, recuperei o interesse, consegui um estágio na ELLE e descobri que aquela revista, com aquelas pessoas, era o melhor e único lugar possível para uma eu transformada pelas experiências anteriores. Como já contei antes, também constatei que namorar não era um bicho de sete cabeças que atrapalharia o meu desenvolvimento pessoal, ao contrário, tem sido uma experiência pra lá de enriquecedora. O que não mudou é que todas as vezes que o percurso saiu da reta, fiz novos planos e quis segui-los à risca — como projetar uma newsletter específica sobre um tema1 e ainda colocar números e data de validade nela.
Me sentir perdida foi uma novidade de 2022, uma sensação desencadeada por ter decidido largar planos traçados há tanto tempo. Não sei se é o seu caso, mas me sentir perdida neste ano também foi menos sobre achar que não existia nada para mim no mundo (algumas vezes aconteceu) e mais sobre me deparar com uma profusão de opções e ficar travada. Eu ainda não consegui decidir se quero entrar em um curso sério de roteiro, escrever um livro, tentar viver desta newsletter, estudar um monte de temas para virar uma ensaísta de respeito, voltar a uma redação ou ser freelancer e produzir grandes reportagens para todos os veículos do Brasil e do mundo.
Nesse contexto, o que quero e acho que devo fazer para 2023 é traçar planos mais leves. Nada contra os específicos quando você já está seguro de uma decisão (se eu já tivesse segurança que quero viver desta newsletter, por exemplo, traçaria estratégias robustas para isso), mas enquanto eu ainda estiver me sentindo perdida, acho que está de bom tamanho ter conseguido identificar um padrão entre todos os meus desejos mais fortes2, no meu caso claramente é a escrita, e me deixar ser surpreendida pelas minhas vontades, pela minha intuição e, claro, pela minha necessidade financeira. Seja lá o que vier, terão coisas boas para serem aproveitadas no durante e coisas que só no futuro serei capaz de entender que foram essenciais para me levar até lá.
Bom, é isso o que eu desejo fazer em 2023 (o futuro dirá se consegui). Acho que esse texto não foi bem um conselho, mas essa é mais ou menos a minha experiência. Só faltam três textos para alcançar a meta dos 24 e como é bem provável que eles tenham clima de revisão, o tema deve aparecer de novo — acho que em um deles valeria até pensar um pouco mais sobre o que significa “ser um perdido” e mergulhar na expressão “o que fazer da vida” (como se não estivéssemos sempre o tempo todo já fazendo algo dela).
É isso por hoje, feliz ano novo e obrigada infinitamente por ler esta newsletter neste ano. Nos vemos em 2023!
Nathalia
Que acabou sendo desvirtuada também porque quando cheguei aqui no Substack descobri um monte de gente passando por processos parecidos com os meus e fui felizmente contaminada por novas ideias e vontades.
Para isso, eu usei uma técnica que aprendi assistindo The Good Place. Leve spoiler a seguir: no episódio 10 da primeira temporada, quando o Chidi está em dúvida sobre quem ele realmente gosta, o Michael coloca na frente dele três sabores de sorvete diferentes, cada um representando uma candidata, e pede para ele fechar os olhos. Quando ele abre os olhos, o Michael escolhe o sabor número 2 e diz a ele que aquela é a alma gêmea dele. Quando Chidi pergunta “como você sabe?”, Michael responde “eu não sei, mas no minuto que falei o nome dela, você soube instintivamente se parecia certo ou não”. Até o meio do ano, eu tinha opções muito diferentes abertas na minha cabeça, entre elas escrita, programação e costura. Eu tentei me enxergar muitas vezes nessas posições usando essa técnica de imaginar uma outra pessoa decidindo por mim e a escrita sempre foi o que se sobressaiu.
Não fui eu quem escreveu a pergunta, mas achei engraçado como poderia ter sido. Consegui me identificar tanto com a pergunta, quanto com a resposta. Sempre bato na tecla de que todo mundo está vivendo as mesmas coisas, mas, acho que mais do que isso, o universo vai dando um jeito de unir as pessoas que estão passando pelas mesmas situações, e aqui estamos todos reunidos no mundinho substack, mais especificamente no seu projeto de newsletter. Espero que a gente fique um pouco menos perdido nos próximos meses e que esse projeto não pare no texto #24, precisamos receber outras reflexões suas que traduzam o que estamos sentindo no ano que vem!
Feliz de acompanhar esse processo e seus passeios deliciosos ❤️ vamos aos três últimos e às próximas aventuras! Boa virada, lindíssima!